segunda-feira, 20 de julho de 2009

A Fatalidade do Amor

“A gente sempre destrói aquilo que mais ama em um campo aberto ou numa emboscada; alguns com a beleza do carinho e outros com a dureza da palavra;covardes destoem com um beijo, os valentes, destroem com a espada”. Paulo Coelho
O amor tem um poder fatal. Mais cedo ou mais tarde, ele acenderá a chama de uma verdade e isto aniquilará a coisa que o comporta. O amor não faz isso por ser um mal, ao contrário, ele age na direção do que é correto, mas muitas vezes é incompreensível à personalidade humana, que ainda é passional.
No homem, ele dá aderência ao moral. Todavia, o moral do homem é dominador e unilateral no sentido do direito que a sociedade lhe conferiu de trair, mas não admitir ser traído; impor suas regras, mas não tolerar as da mulher; exigir compreensão e perdão, mas não perdoar uma companheira que não age conforme suas determinações; conquistar levianamente sem zelar pela estabilidade emocional da mulher conquistada, e por aí vai.
Na mulher, por sua vez, ele adere, prioritariamente, à carência, própria da mulher sensível, e à cadeia hormonal do ciclo menstrual e se torna histeria, confusão mental, tenebroso descontrole emocional; muitas vezes, isso resulta em depressão que pode chegar à insanidade e até ao suicídio. Em ambos os casos pode gerar crimes passionais ou, mais propriamente no caso das mulheres, grandes ardis orquestrados pelo sentimento de vingança. O curioso é que os dois, tanto o homem quanto a mulher, agem com incrível poder destrutivo em nome do amor.
No mundo de dualidades em que vivemos, é comum atribuir ao amor a responsabilidade pela existência do ódio. Não é uma associação de todo errônea, mas isto tem sido um foco nocivo para o psiquismo humano, que se habituou às dicotomias sem se habilitar, como deveria, com o aspecto totalitário das questões.
Assim, numa existência sem clareza em que a necessidade do amor se confunde com o extenso planalto de carência que há no íntimo da maioria dos seres humanos, o objeto de desejo é ou se torna facilmente uma obsessão, e o casamento é uma rinha onde vez em quando os cônjuges se confrontam.
Quanto mais o inconsciente coletivo aventa a ideia do individualismo libertador, mais se intensificam as brigas, os confrontos entre homens e mulheres e, obviamente, os crimes passionais. Isto se dá porque ninguém, ainda, atentou para o fato de que o equilíbrio não está em dar à mulher o poder que o homem tem exercido há séculos, mas em sair fora do círculo de poder onde os gêneros humanos se confrontam. É hora, pois, de rever o foco humano para que enfim se possam eleger os direitos e deveres do ser dito pensante como ser completo e igual a outro, tanto em potencialidade quanto em recursos.
Porém, nem sempre a consciência adquirida disto, nem da real importância e característica do individualismo inspirado pelo alto em nossos dias, liberta o amante da passionalidade animal que surge em meio à rejeição do objeto do seu amor.
Nesse contexto, revelam-se claramente as diferentes naturezas amorosas de Jesus, que é um com o Pai Amantíssimo, e de Javé, que é o deus criador deste universo.
O consórcio do homem ou da mulher com a natureza de Jesus, que é afável e dulcíssima, inspira à renúncia ou, em grau menor, à resignação. Porém, é uma aliança que se escolhe fazer quando se compreende e se aceita o Cristianismo. Em outras palavras, é uma escolha que fazemos em nome do amor pacífico e repleto de mansuetude, como é o do próprio Mestre.
O consórcio com o amor punitivo e exigente de Javé, ao contrário, não é decorrente de uma escolha consciente. Ele faz parte de uma herança genética que impregna nosso psiquismo com tamanha força que poucos são os que escapam de seu controle.
Entendamos que, por não ser compreendido e tampouco aceito, o amor que sofre rejeição nos parece terrível porque age no psiquismo humano com a carga genética de um deus aflito que ama não com a doçura de Jesus, mas com o desespero de quem precisa exercer o controle sobre a sua criação e tem dificuldade em aceitar, na condição em que está, outro tipo de tratamento que não o da subordinação plena.
Jesus ensina através do próprio exemplo, ama sem pedir nada em troca e exerce com extrema leveza seu jugo. Javé, ao contrário, ordena, impõe leis severas, pune quem não as cumpre.
Afora a ousadia da qual me municio enquanto autora dessa reflexão, essas questões estão em boa hora de serem aprofundadas no exercício de meditação ou introspecção de cada ser humano sobre a terra, já que estamos aparentemente todos já cansados de repetir experiências tendo de pendermos sempre para extremos, sem jamais experimentarmos o libertador caminho do meio sugerido por Budha. Todavia, é justamente no caminho do meio que se encontra a trilha possível para o eu superior, que é desprovido do psiquismo, que é inerente à personalidade.
A liberdade e a vida eterna pertencem a esse espírito de identidade, suprema sobre todas as demais, que a personalidade cria para se manter na grandiosa rede genética de Javé. Mas também o amor, em sua forma ampla, criadora e ígnea, é algo que nutre e pertence a este eu superior. E este é o amor que se encontra no seio e no todo que é Jesus.
Já o que se vê nas formas menores do ser, tanto no homem quanto na mulher, é apenas um retalho de amor. No tanto que suporta a frágil personalidade, que está fadada a morrer diante do próprio eu que o rege sob a lei da fatalidade que o amor congrega no exercício de sua plenitude, sendo assim incondicional, não há esperanças de liberdade espiritual; pelo menos, não enquanto houver segregação de gêneros, raças, ideologias etc. Pois a personalidade chegou ao seu limite de suportabilidade; e apenas porque não compreende que para ir além é necessário abrir mão de si mesma, engendra em seu ventre a semente de destruição que sofre, abandona e até mata por amor.
Lúcia Roberta Mello

domingo, 5 de julho de 2009

Psiquismo, uma ilusão onde o bem e o mal residem

Controle da mente, hipnose de reprogramação, mudança de DNA, indução, linha do tempo e outros são apenas paliativos que atingem o psiquismo. Até que ponto esses recursos mudam mesmo uma pessoa?

Desde que os Estados Unidos começaram a lançar livros de auto-ajuda, a humanidade tem se voltado cada vez mais para técnicas que prometem mudanças rápidas e eficazes nos padrões de comportamento, limpeza do passado triste ou doloroso, libertação de traumas e até mudança de DNA.
Não podemos negar que os resultados chegam com certa prontidão, no sentido de que a pessoa fica por algum tempo mais envolvida consigo mesma, mais otimista com relação ao sucesso que poderá alcançar na vida, além de aprender responder aos percalços do caminho com mais otimismo. Porém, em que parte do composto humano essas técnicas atuam?
Nas últimas décadas temos nos envolvido tanto com o avanço da medicina, seus antibióticos potentes e exames minuciosos proporcionando a rápida recuperação dos pacientes, que desejamos imprimir o mesmo imediatismo nas questões psíquicas.
Da mesma forma, com o crescente número de igrejas que ensinam seus fiéis a exigirem de Deus mudanças radicais em suas vidas materiais em troca da fé e do dízimo que lhe ofertam, evidencia-se um novo padrão de comportamento humano. Na verdade, não sei se é tão novo assim, já que o próprio Sr. Jeová, ao tempo em que elegia profetas para falarem em Seu nome, fazia barganhas como essas com seus escolhidos.
Na pressa ou imediatismo que envolve a busca por resultados se escondem uma crença padronizada de que algo externo vai mudar seu modo de ser, sua condição financeira, seu nível de satisfação para consigo mesmo e para com o mundo como um todo. Ou seja, uma crença imperiosa de que a responsabilidade de qualquer mudança não recai sobre seus próprios esforços, mas na competência de outrem.
Não é à toa que a cirurgia plástica tem feito tanto sucesso no mundo. Ela é capaz de trazer resultados rápidos para uma mudança efetiva da aparência com a qual não se está satisfeito.
E o ponto é justamente este: aparência!
Ao se verem ofertadas receitas práticas de operar mudanças íntimas, pessoais e inadequadas, muitas vezes desagradáveis até ao convívio social, as pessoas se inclinam a comprar aquela que se lhe pareça mais rápida ou eficaz, conforme o sistema de crenças de cada um.
A questão é que o conjunto psíquico que compreende comportamentos, reações humanas e até emoções, não passa de uma roupagem aparente que esconde o verdadeiro eu que há em todos nós, essencialmente falando. E tudo o que é superficial ao ser interior é acessório para o espírito, que necessita dessa roupagem para viver as experiências terrenas. Disto se deduz que tanto o corpo quanto o psiquismo são meros instrumentos dos quais o espírito se serve para se lapidar intimamente, mas jamais serão o seu eu verdadeiro.
Da mesma forma como a cirurgia plástica altera o que há de indesejável em seu corpo físico, técnicas de PNL, hipnose, indução e reprogramação mental alteram o que há de indesejável em sua personalidade. E a pressa de mudar é tanta que não se perde tempo em procurar outra via de mudança.
Todavia, se nem o corpo físico nem a personalidade são de fato você, como esses paliativos de mudança podem ajudar você a mudar?
Na verdade, não podem muito. É muito válido ter uma aparência melhor para ser aceito na sociedade. Semelhantemente, é muito válido um temperamento moderado para quem deseja adquirir um conjunto de comportamento mais equilibrado. Mas você não vai se tornar um espírito melhor por conta dessas mudanças exteriores.
O problema está em conhecer a medida do que é ser melhor. No mundo de ilusões em que vivemos, atuando com um corpo ilusório e um psiquismo também feito de ilusão, não se objetiva a outro resultado senão a aprovação do seu semelhante, dentro dos próprios padrões de aceitação que desenvolvemos em nossa sociedade, ou seja, dentro dos padrões que regem essa transitoriedade que, para o espírito, é totalmente ilusória.
Nenhuma técnica de atuação psíquica pode lhe dar resultados eficazes no sentido de progressão espiritual como a meditação.
É o mestre Paramahansa Yogananda quem nos revela, no livro Autobiografia de um Iogue, que toda verdade, luz e cura estão dentro de nós mesmos, e não em algum lugar fora.
O mestre Yogananda ensina a prática da meditação, na qual se deve perguntar “o que há por trás dos meus olhos fechados?”. No intervalo entre a inspiração e a expiração, no silêncio que a meditação e a prática da respiração proporcionam à mente superior, aos poucos a resposta surge, como um véu interior que se descortina deixando emergir a luz da verdadeira consciência.
Quem desperta a luz da própria alma, que é a verdadeira consciência do espírito, consegue um nível de equilíbrio interior que se reflete pouco a pouco na roupagem tanto corpórea quanto psíquica
Se o corpo físico é repositório para um sem número de males, o corpo psíquico também o é, com o agravante de servir como morada para a maior expressão da dualidade: o bem e o mal.
Se há um fundamento transcendental para a profecia do Juízo Final, quando haverá a separação do joio e do trigo (metáfora para mal e bem, respectivamente), ele certamente está relacionado a este nossos tempos em que, sem poder compreender os afãs do espírito, impregnamos nosso psiquismo com aquela tal “pressa da melhora”. Apenas o foco da mudança está equivocado: não é mudando o corpo ou o psiquismo que nos libertaremos do mal ou, mais profundamente, da dualidade que o abraça, mas sim mergulhando em nosso próprio íntimo até que se acenda a luz de nossa alma.
Não há outra forma de se obter saúde integral ou consciência desperta. Se você deseja uma mudança efetiva, uma evolução segura e equilíbrio total, deve se habituar à prática da meditação que o libertará de toda e qualquer forma de apego, esse grilhão atroz que elegeu o corpo como principal veículo do ser e o psiquismo como o próprio ser.

Lúcia Roberta Mello